O deputado do PT-SP, Paulo Teixeira, proferiu ontem, durante o grande expediente da Câmara dos Deputados, discurso propondo mudança na legislação brasileira sobre drogas. Consideradas ousadas, pelo próprio deputado, as soluções são, na verdade, pragmáticas e totalmente adequadas à nossa realidade. Iniciativas como estas já estão sendo adotadas em diversos países, como ele mesmo cita, em seu discurso.
Com o discurso intitulado "A mudança na legislação e na política de drogas é urgente", Paulo Teixeira, defendeu um tema importantíssimo, baseando sua fala em fatos e evidências científicas e acima de tudo, poupando-nos de preceitos morais retrógrados, os quais estamos tão acostumados a ouvir. Demonstrou, também, profundo conhecimento do tema, citando exemplos de sucesso, já implementados em vários países, e sugerindo propostas concretas e adaptadas à realidade brasileira.
Tráfico, violência e vulnerabilidade social
"O número de mortes em conflitos relacionados ao mercado de drogas é muito maior do que as mortes que são provocadas pelo uso da droga em si. Apesar desta repressão, o consumo de drogas ilícitas no Brasil cresceu nos últimos anos e o número de presos condenados por atividades relacionadas à venda e ao consumo destas substâncias também está em ascensão. Precisamos de respostas adequadas e pragmáticas, que tenham condições de diminuir o problema e tranquilizar a sociedade."
"Mas, acima de tudo, é preciso combater a vulnerabilidade social, para que as pessoas conheçam os riscos do uso destas substâncias e possam ter condições de fazer as melhores escolhas para a sua vida. A vulnerabilidade é inimiga da autonomia e da liberdade para tomar decisões por conta própria. Para combater este problema que enfraquece a existência destas pessoas como cidadãos, é preciso levar informações, educação e cultura para estas regiões. O Estado Brasileiro não pode ser visto nestas partes das cidades apenas pela sua força repressiva, mas principalmente pela sua face social, para dar alternativas que garantam a todos a integralidade da cidadania e dos direitos humanos."
"Parte do consumo destas substâncias ilícitas é eventual e não apresenta risco à sociedade. São pessoas que usam maconha, por exemplo, sem que o consumo prejudique a sua vida social e produtiva. Como no álcool, existe muita gente que faz o uso responsável e uma parte que acaba tendo problemas causados pelo abuso. A proibição também provoca que estes consumidores tenham um contato com criminosos que eles próprios, em muitos casos, não gostariam de ter. Por conta desta relação, os usuários passam a ser estigmatizados pela sociedade e, em muitas situações, apontados injustamente como responsáveis pelo financiamento do crime organizado."
"Historicamente, a questão do consumo de drogas no Brasil foi tratado apenas de forma repressiva, resultado da adesão completa à política de guerra às drogas iniciada nos Estados Unidos na década de 70 (...) Em um segundo momento, o combate às drogas ganha, além da força repressiva, uma abordagem médico-psiquiátrica, com internação compulsória e aplicação de medicamentos no seu tratamento."
"É importante que a comunidade médica brasileira discuta como fazer o tratamento do dependente crônico e problemático, inclusive com a análise de estratégias que deram certo em outros países, como os tratamentos de substituição de uma droga ilícita por substância lícita ou ilícita, a prescrição médica de substância ilícita e a criação de salas de uso seguro, para que as pessoas possam fazer o consumo seguro e com os efeitos da droga monitorados."
"O Brasil é signatário de convenções internacionais que impedem a legalização, mas é importante que o Brasil possa levar ao plano internacional a discussão sobre a legalização de drogas leves."
"É possível e necessário fazer uma política de transição entre o estágio atual e a legalização, com a descriminalização do uso e da posse de pequenas quantidades para o uso pessoal. (...) Isso leva com que os usuários passem a ser tratados definitivamente fora da esfera criminal. E, no caso do abuso, dentro do sistema de saúde. Defendo que o Brasil também faça a descriminalização do uso e do porte para consumo próprio."
"Um usuário que em razão de uma dependência química passa a comercializar a substância para garantir o seu consumo não pode ser tratado da mesma forma do que a pessoa que busca o lucro nestas atividades, exerce controle territorial sobre regiões e usa de violência e mortes para cobrar eventuais dívidas. (...) O convívio em cadeias dominadas por organizações criminosas acaba fazendo com que estas pessoas passem a ter contato com outro tipo de criminalidade, capaz de atrai-las para cometer crimes mais graves a mando destas facções."
E agora, deputado?
Realmente esperamos que as propostas não sejam massacradas na CONAD, ainda gerida por um militar ou esquecidas pelos deputados que ouviram o discurso. Que este seja apenas o início de uma intensa discussão que precisamos ter entre os vários setores da sociedade e do governo.
Leia o discurso completo
Leia a notícia do Globo
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